domingo, 6 de fevereiro de 2011

A propósito das instituições

A instituição sefardita (judeus da Europa Ocidental) Avodat hesed, fundada em Amesterdão em meados do século XVII é um dos exemplos de uma associação formada para fins filantrópicos (como tantas outras no âmbito de uma sociedade religiosa), mais concretamente, a sua criação visava a prática da caridade para com os judeus pobres recentemente imigrados da Europa Oriental - judeus Asquenazins. Podemos entender o aparecimento desta instituição como uma forma de controlo social dos Sefarditas, primeiramente instalados na Holanda, sobre os Asquenazins. As práticas individuais de caridade para com este último grupo de judeus, os quais mendigavam na rua aos olhos dos Holandeses, - para consternação dos Sefarditas - foram formalmente interditas por estes. A regulação destas práticas individuais num quadro colectivo dita o surgimento da instituição com objectivos filantrópicos. A instituição nasce assim de um consenso moral amplamente partilhado. As práticas aleatórias individuais provocam injustiças dentro do grupo dos Asquenazins, uma vez que uns obterão mais sucesso do que outros - não particularmente os mais necessitados -, mas, e sobretudo, essas práticas apenas concorrem para a alimentação do fenómeno da mendicidade e da indigência. Tal como o célebre ditado: «Não dês o peixe, mas ensina-o a pescar». O que somente pode ser realizado no quadro de uma instituição: a função educadora.

Atentemos num excerto do livro de Steven Nadler, sobre a vida de Espinosa (pp. 34-35):

«Apesar das disparidades culturais e sociais entre os dois grupos – os casamentos entre eles eram energicamente desaprovados – bem como o embaraço visível que os Asquenazins causavam aos sefarditas perante os Holandeses, os Portugueses eram financeiramente generosos para com estes empobrecidos Europeus do Centro e Leste. Após 1628, os deputados decidiram reservar um determinado montante, retirado da imposta, para ser distribuído pelos Asquenazins carenciados. Semelhante simpatia e generosidade, porém, não iria demorar muito. Os Portugueses depressa perderam a paciência com os seus vizinhos indigentes. Em 1632, ano do nascimento de Espinosa, foi aprovada a colocação de duas caixas para a recolha de esmolas destinadas aos Asquenazins, de «forma a evitar os inconvenientes e o alvoroço provocados por Asquenazins que mendigavam às portas». Em 1634, passou a ser proibida a caridade privada e punível a caridade individual para com os Judeus alemães, polacos ou lituanos. Continuou a existir algum apoio institucional – particularmente através da instituição Avodat hesed – mas somas consideráveis provenientes dos rendimentos da comunidade eram especificamente destinadas a «reenviar os nossos irmãos pobres» para os seus países de origem»

Podemos aqui observar explicitamente a hierarquia de estatutos entre os três grupos referenciados, bem como as práticas de discriminação de um grupo de judeus (já instalados) sobre um outro - os recém-chegados outsiders. No tempo de Espinosa. 
E contudo, não podemos olvidar os ganhos de equidade e de moralidade que a manutenção das instituições permitem relativamente aos indivíduos outsiders. Pois instituição é sinónimo de educação: uma socialização dentro da instituição. A sua finalidade é de proporcionar oportunidades colectivas a grupos mais vulneráveis.

Como então entender as reacções modernas de muitos adolescentes e jovens de hoje: de rejeição quase física das instituições? Fica aqui mais uma questão em aberto. Para reflectir. 

Sem comentários:

Enviar um comentário